Fake news, polarizações exacerbadas, ultraexposição, pulverização da influência e mais uma coleção de dificuldades que hoje assombram as organizações. E, no meio disso tudo, elas precisam proteger sua reputação – com comunicação
Para a estreia da coluna, a editora sugere: que tal um olhar sobre como evoluiu a comunicação corporativa no Brasil nas últimas décadas? Desafio aceito, fui rever um dos _cases_ mais famosos e estudados por aqui, que fez história e acabou gerando um livro hoje (infelizmente) difícil de encontrar, chamado “Portas Abertas” (ed. Círculo do Livro, 1990).
Em menos de 200 páginas, o _case_ conta como a Rhodia, uma enorme, poderosa e então já quase centenária multinacional no Brasil dos anos 1980, entendeu e aproveitou o momento de abertura institucional no país (e de transformações sociais em todo o planeta) para se reposicionar. O programa desenhado com esse objetivo, o Portas Abertas detalhado no livro, é impressionantemente atual quase quatro décadas depois. E é atual porque o mundo mudou, mas os fundamentos da boa comunicação corporativa permanecem os mesmos – resumidos, na Rhodia, em três pilares objetivos:
– Comunicação não é útil, é indispensável;
– Comunicação não é despesa, é investimento; e
– Comunicação é um processo permanente.
É verdade que aquele era um tempo sem internet, fake news, polarizações exacerbadas, ultraexposição, pulverização da influência e mais uma coleção de dificuldades que hoje assombram as organizações. Mesmo assim, quando se revisita o _case_, ficam claras como as lições deixadas por ele continuam servindo (mas nem toda organização aprendeu…ainda). Vamos a elas:
1. Comunicação funciona quando faz parte da estratégia do negócio. O programa da Rhodia foi uma decisão da alta liderança, aprovada com a matriz e tinha o presidente – o executivo Edson Vaz Musa, primeiro brasileiro a liderar uma multinacional – como abre-alas, porta-voz e principal fiador. Como resultado, a Rhodia efetivamente reposicionou a imagem e consolidou uma reputação sólida – não por acaso, também ampliou os lucros e cresceu em valor de mercado, se tornando uma das mais influentes empresas do cenário brasileiro da época.
2. Comunicação funciona quando tem especialistas no comando. A alta liderança da Rhodia entendeu que precisava se envolver e bancar o programa, mas deixou sua criação e implantação nas mãos de quem entende do riscado – no caso, o relações públicas Walter Nori, que assina o livro, e um time de outros craques como ele. As decisões estratégicas eram tomadas com esses especialistas na mesa, levando em conta sua visão de todos os impactos nos públicos de interesse.
3. Comunicação começa com o público interno. A lição é intuitiva: um time de gente informada, conectada e valorizada eleva a produtividade, a retenção de talentos e o número de embaixadores da marca. A Rhodia sabia disso, e mais: que público interno inclui famílias e amigos, terceiros, fornecedores, parceiros e comunidade próxima. Apostar nesses embaixadores foi um de seus maiores acertos.
4. A receita tem que ser muito simples. Análise apurada do contexto formatada em ações exequíveis, planejamento e (muita) gestão estratégica. Em resumo: é preciso saber de onde se sai e aonde se vai. E é fundamental que esse caminho tenha aderência com o momento que a sociedade atravessa, para gerar engajamento, e tenha coerência com toda a história e o comportamento da organização, para criar a narrativa legítima. Os gringos chamam de “walk the talk”. Na Rhodia, eles somaram a ideia do “processo permanente”.
E, sim, é preciso medir resultados. Lá no tempo do Portas Abertas, isso era ainda uma novidade, e o programa criou e testou algumas maneiras de fazer isso. Hoje, é inescapável – se o ROI é rei nas organizações, não pode ser diferente na comunicação. Ou a sua organização ainda não entendeu que reputação, hoje, é o maior ativo que ela possui? Vamos falar disso na próxima coluna.